A cerca de um mês atrás, por incrível coincidência - e para alguns parecerá história de pescador, mas como dizia meu tio-avô doido: é tudo verdade! - passávamos eu e um amigo, o Varda, por debaixo da ponte Colombo Salles, a caminho de não me lembro exatamente onde. Ao avistar o emaranhado de cabos e tubulações que se cruzavam por debaixo da ponte, ele fez um comentário:

- Isso, com certeza, é a maior cagada que já se fez nessa cidade!
- Por que?
- Porque toda a alimentação de energia da ilha passa por aqui. Se acontece alguma coisa, é blecaute total, não tem nem plano de emergência.
- Ih, então vou ter de mudar meus planos.
- Que planos?
- Eu planejava explodir a ponte pra criar uma nação independente, mas aí eu ia ficar sem internet...

E eis que lá estava eu, num início de tarde, ainda sentindo nos cantos dos dentes alguns restos de macarrão com salsichas e molho, me recuperando de uma ressaca de tequila; quando sem aviso tudo se desliga. Televisão, computador e todos os badulaques eletrônicos que a classe média moderna está tão acostumada a deixar ligados o dia inteiro, mesmo sem motivos.

- Apagão! - disse Luís André, o proprietário da casa.
- Tem isso por aqui? - interpelei quase que imediatamente, sem saber se ironizava com a precariedade do edifício ou se defendia a minha cidade, onde "esas coisas não acontecem".

Foi a desculpa para que eu, Luís André e Dagoberto nos despedíssemos e cada um tomasse o seu rumo. Luís e Dagoberto para a trindade, e eu para o continente.
Passando pelo centor da cidade, percebi alguns burburinhos, alguns comentários, o clássico "algo no ar" que não se sabe definir a origem ou muito menos se dá atenção ao significado. O primeiro momento em que deixei-me ouvir a voz do ambiente foi ao atravessar a rua:

- Ah, é mesmo... Não tem luz! - disse uma senhora para a filha. Só então dei-me conta que o centro todo estava sem energia. Nada que não retornasse ao seu normal em alguns minutos. Provavelmente um funcionário tentando mostrar serviço havia rompido um cabo ou dois, pensei.

A situação completa, na verdade, só foi alcançar o meu distraído cérebro por volta das cinco da tarde. Meu sogro falara ao telefone algo sobre um carro pegando fogo e asfalto derretido. Ninguém entendeu nada e coube à televisão dar-nos maiores detalhes. Depois do fato esclarecido, um espetáculo à parte: da sacada da minha namorada, Célia (creio que todos que por aqui passam a conhecem) víamos tudo, incluindo a hilário ponte Hercílio Luz acesa pela metade. Pedi à minha mãe que trancasse todas as portas e janelas, e que proibisse meu irmão de sair à rua após o anoitecer. Apesar de tantas precauções tomadas, não houveram maiores tragédias no que se refere à segurança pública (nada além dos assassinatos e roubos já tão comuns, melhor dizer). Meu sogro, cheio de ciúmes desde que cheguei naquela casa, alfinetava os meus conterrâneos:

- Tinha de ser coisa de catarinense.

Lá pela enésima e tanta provocação do velho (que, em minha opinião, não tem porquê de ser muitas vezes insuportável, somente por estar na casa dos setenta), ignorei completamente a prudência e a boa educação, e pus-me a defender os meus, curta e grossamente:

- Graças a Deus que essas coisas só acontecem com esses "catarinenses de merda". Se fosse com aqueles cariocas, daqui ia dar pra ver os incêndios, saques e arrastões.

0 Comments:

Post a Comment




 

Copyright 2006| Blogger Templates by GeckoandFly modified and converted to Blogger Beta by Blogcrowds.
No part of the content or the blog may be reproduced without prior written permission.