Quando saiu em vídeo "Seven - Os Sete Pecados Capitais", lembro de ter lido (não sei se numa crítica ou na própria capa da fita) uma frase que falava da inveja de vários cineastas por nunca terem pensado numa idéia tão simples e tão boa. Longe de fazer minhas estas palavras, sou levado a concordar, no entanto, que é um filme muito bom e - até que se prove o contrário - bastante original.
O mesmo não pode-se dizer sobre a trilogia Matrix - cuja terceira e última parte estréia nos cinemas dentro de poucos dias - pelo menos no que diz respeito à originalidade. Claro, o primeiro filme marcou época, fez milhares de pessoas dividirem suas opiniões entre "pop" e "cult", muitas sem compreenderem as obras e eventos que levaram à utilização destes conceitos até hoje. O segundo filme criou aquela expectativa, "o que eles vão inventar agora?", e nos fazia (ou me fez, pelo menos) babar a cada nova cena divulgada na mídia. Pena não ter correspondido à expectativa. O excesso de utilização do "dublê digital" é algo que acaba com muito da graça do primeiro filme. O clima messiânico e filosófico pode colaborar para a profundidade e conteúdo, a solidificação e justificativa de uma trama; porém fez muitos conhecidos meus saírem do cinema com mais dúvidas que respostas. E eu conheço pouquíssimas pessoas que conseguem gostar de um filme que sequer entenderam. Claro, há possibilidades ainda piores que não entender o filme. Há os que entendem, à sua maneira, se embrenham em vagarosas discussões com outros amigos (que também acham que entenderam) e daí surgem teorias bizarras como a "matrix inside the matrix" e suas definições "green" e "blue". Cito estes exemplos, pois faço parte deste seleto grupo de pessoas que acreditam piamente que entenderam a loucura toda, e estão arriscados a darem de cara no muro com o lançamento do terceiro filme.
Anyway, eu falava da criatividade de Matrix. A premissa do filme me obrigou a ver cenas lastimáveis de adolescentes perguntando "como você sabe que o rosa que eu vejo é o mesmo rosa que você vê" ou falando de suicídio, "já que o mundo não é real, mesmo". Causa este furor e toda esta ladainha graças à mídia em que foi transmitida. A premissa, porém, é mais velha que o tempo em que minha avó trepava.
Pra começar, vamos falar de Lewis Carrol. Matrix credita muito de sua trama a Aline no país das Maravilhas com seus "siga o coelho branco" e "vamos ver quão funda é a toca do coelho". Vi muito gente falando de boca cheia sobre Alice... depois de assistir ao filme, como se fossem grandes experts no assunto. Mas poucos são os que falam de Aline no país dos espelhos onde está a grande inspiração de Matrix. Tweedledee e Tweedledum perguntam a Alice se ela sabe o que o Rei Vermelho está sonhando, e ela diz que não. É então que lhe dizem que o Rei está sonhando com ela própria, e que tudo aquilo é parte do sonho dele. "Nunca tente acordá-lo ou você irá sumir", eles dizem.
Na década de sessenta, os editores de quadrinhos tiveram a idéia de juntar Jay Garrick e Barry Alllen (respectivamente o primeiro - publicado no Brasil como "Joel Ciclone" - e o segundo Flash) numa mesma história. O grande problema: quando o segundo foi lançado, os editores haviam dito aos leitores que Jay Garrick era um mero personagem de quadrinhos, tanto no mundo real quanto no mundo de Barry Allen. Para justificar o encontro, foi dito que Gardner Fox - escritor do Flash - quando dormia vibrava numa frequência igual à da realidade de Jay Garrick, por isso dizia que as histórias lhe vinham em sonhos. Isso explicava inclusive por que a revista do Flash havia sido cancelada no fim da década de quarenta - Jay Garrick havia se aposentado, e por isso Fox não mais "sonhava" com o herói.
Já que estamos falando de quadrinhos, vamos mais à frente, com Alan Moore. Moore havia dito em uma entrevista no início da década de oitenta, como tinha vontade de atualizar um antigo personagem britânico, Marvel Man (cópia do Capitão Marvel, criada quando este teve suas histórias interrompidas). Dito e feito, coube a ele dar toda uma nova roupagem ao herói, esquecer o seu passado de vilões engraçadinhos e parceiros pré-púberes com frases decoradas. Na reformulação feita por Moore, Marvel Man (Jack Marvel, quando publicado pela primeira vez no Brasil, e Miracleman, na nova versão - tanto aqui quanto nos EUA) fazia parte de um projeto secreto do governo britânico, que visava unir super-seres criados artificialmente, a humanos controlados pelo estado. Isso era possível enviando estes seres para um micro-universo paralelo, e ligando-os psiquicamente aos humanos-cobaias. Um gatilho mental (uma palavra mágica como "shazam", ou no caso de Marvel Man, "kimota") permitia os alter-egos trocarem de lugar temporarimanete, transferindo-os de uma realidade para a outra. Para maior controle sobre estes "super-soldados", a alternativa encontrada foi criá-los dentro de uma realidade virtual, onde se viam no papel de super-heróis.
uma década depois, a DC lançou seu selo de quadrinhos adultos, com séries como Hellblazer e Livros da Magia. Numa mini-série cujo título não consigo lembrar, contava-se de uma Inglaterra opressiva, onde haviam olhos e ouvidos da Rainha por todos os lados, e tanto a Rainha quanto a própria realidade não passavam de uma simulação criada por uma máquina fantástica (e quase mítica), chamada computador.
O próprio Morpheus pode ser uma clara referência aos quadrinhos (fonte da qual os irmãos Larry e Andy Wachowski nunca negaram beber) de Sandman, que personifica todo o universo dos sonhos.
Neo, por si só, é o arquétipo do super-herói. Começando por seu nome (ou "nickname", codinome, whatever), um anagrama de "one", um, ou "the one", o escolhido, etecetera. Um homem comum, escolhido entre tantos outros para se tornar um campeão e lutar por um mundo melhor. Todos os acessórios estão lá: máscara (óculos escuros), capa (sobretudo), habilidades sobre-humanas e uma missão digna.

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