Bom... Já que a única testemunha direta do caso fui eu, acho que um esclarecimento da minha parte é devido. Saiu uma matéria hoje no Diário Catarinense, na verdade uma pequena nota, no fim da página, sobre o ocorrido, que pode ser lida aqui. Os textos diferem, da versão impressa para a versão on-line, principalmente na questão dos nomes. No jornal, encerram a reportagem com a frase "O DC omitiu os nomes dos envolvidos, pois não houve flagrante". Porém, como pode ser facilmente percebido na versão on-line, os nomes - tanto do Skayller, da Dadi, quanto da mãe dela - foram todos citados. Ainda foi adicionada uma denúncia, de que o Skayller teria roubado o celular e o dinheiro da Dadi, coisa que é totalmente mentirosa, já que o celular em questão, que a Dadi usou o tempo todo, era do próprio Skayller, e todo o dinheiro usado no acampamento - para passagens de ônibus, cigarros, comida e demais - havia sido emprestado por ele. O desinteresse pela verdade fica óbvio, já que ninguém do jornal tomou a iniciativa de me ligar perguntado uma versão imparcial da história, já que ambas as partes, acusado e acusadora, me indicaram como testemunha em suas respectivas denúncias.
Quanto ao ocorrido: sim, o Skayller cometeu uma agressão. Errou, e sabe disso. Eu estava lá, e quase perdi o controle também. Pra quem tiver paciência de suportar a minha narrativa cansativa, a descrição completa do que vi/ouvi segue abaixo.
Bebemos madrugada adentro. Foram quase duas garrafas de vodka. Quase, porque o Skayller guardou um pouco da última garrafa para beber depois. Estávamos eu e ele em sua barraca, e a Dadi do lado de fora, conversando com o resto do pessoal. Ele abriu a barraca e chamou a Dadi uma vez. Ela disse que já ia. Ela entrou na barraca, pegou o resto de vodka, e saiu novamente. Depois de algum tempo, o Skayller a chamou de novo. Ela não foi. Passou mais um bom tempo e ele saiu da barraca, dizendo que ia procurá-la.
Alguns minutos depois ele voltou e me mandou para a minha barraca, com expressão séria. Fui, e encontrei a Dadi dormindo lá. Acordei-a, conversei algumas coisas, e acabei dormindo também, abraçado com ela. Acordei com o Skayller na porta da barraca. "Dadi. Acorda e vamos pra nossa barraca. Agora."
Segundo a Dadi, ela entrou na barraca e ele estava arrumando algumas coisas. Ele me confirmou isso depois. Disse que estava se preparando para ir embora. Segundo ela, ela se virou para o lado e dormiu. Nesse momento, ouvi ele dizer que queria conversar.
Eu estava cansado, e virei para o lado, tentando dormir. Mas não consegui, pois percebi que os dois estavam discutindo. Não escutei muito do início da conversa, mas pude entender que o problema era ela ter ficado fora da barraca conversando com o Robô, e depois ter dormido comigo, ao invés de fazer companhia ao namorado.
"Briga de namorados. Eles que são brancos que se entendam", foi o que pensei. E novamente tentei dormir. Não consegui, claro. Ouvi a Dadi dizer "o que menos me custa é pegar minhas coisas e ir embora". "Tá esperando o quê?", o Skayller disse em resposta. O que se seguiu foi meio confuso. Ouvi movimentos bruscos, um "sai daqui" do Skayller, depois um tombo perto da minha barraca. "Não tenta me bater". Ele repetiu isso três vezes e eu ouvi uma engasgada, como se a Dadi tentasse dizer alguma coisa e não conseguisse. Mais movimentos bruscos, um baque distante. Foi quando ouvi a Dadi me chamar, e o Skayller dizer "não faz escândalo". Saí da barraca apressado e vi o Skayller de pé, encostado na parede da igreja, com uma das mãos na boca da dadi, sentada no chão e empurrando-o para trás.
A Dadi não explicou muito bem o que houve. Só gritava que ele havia tentado matá-la. O Skayller me disse, depois, que ela tentou agredi-lo por causa dos cigarros, e ele a empurrou para fora da barraca. Foi quando ela tentou chutá-lo, e os dois caíram na frente da minha barraca. A própria Dadi confirmou que ele sentou sobre as pernas dela, para ela parar de chutar. Então ele segurou-a pelo pescoço e disse para não tentar bater nele. "Enquanto me sufocava, ele disse que me mataria" é o que diz na matéria do jornal. Bom. Nesse momento eu já havia desistido de tentar dormir, e eles estavam na frente da minha barraca. Juro que não ouvi ele dizer nada disso.
Quando saí da barraca, e separei os dois, ela disse "esse filho da puta tentou me matar" e saiu em disparada pela trilha. Tentei pará-la, pedi várias vezes que ela me escutasse, conversasse comigo. Disse que ela não podia subir a trilha de noite. "Eu vou embora assim! Sem nada! Vou pra casa!" foi o que ela disse. Tentei segurá-la algumas vezes e quase levei uns tapas por isso. Então desisti e parei, pois sabia que ela voltaria. Em menos de dez segundos ela veio correndo em minha direção, dizendo que estava escuro demais, não via nada, e não tinha como ir embora.
Como ela tinha medo de voltar ao acampamento, passei na barraca do _Infectus_ e pedi a faca dele. Sabia que o Skayller não faria nada, mas queria fazê-la sentir-se mais segura. Com a faca na cintura, sentei com ela e comecei a tentar conversar, enquanto o Skayller arrumava a mochila e desmontava a barraca. Ela chorava muito e xingava o Skayller. Chegou a correr para cima dele, mas a impedi. O Skayller só dizia "tira ela de perto de mim", e continuava a enrolar a barraca. Em certo momento, ele resolveu responder às ameaças dela (sobre o que a mãe dela faria com ele), e chamou a mãe dela de drogada, Narcótica Anônima. Ela então pegou a faca que estava comigo e avançou para cima dele. Não fez nada, porque não teve coragem, e porque tirei a faca da mão dela a tempo. Depois começou a gritar, acordando todos da casa ao lado. "Socorro! Socorro! Querem me matar!", ela gritava. Nessa hora, o Skayller estava a cinco metros de distância dela, quieto, de costas, terminando de guardar a barraca. Ela pegou meu celular e disse que iria ligar para a mãe. Para a mãe dele também, inclusive. Eu disse que não. Pedi que tivesse um mínimo de respeito pela mãe dela e ao menos esperasse o Skayller ir embora, e até amanhecer.
Conversei um pouco com o Skayller, disse que ele vacilou, passou da linha. "Haviam mil maneiras de você resolver a situação, mas você perdeu a razão, partindo pra violência". Ele se justificou várias vezes. Disse que ela havia tentado bater nele. "Mesmo assim, não justifica", eu disse. Ele pôs a mochila nas costas e foi embora.
Nesse momento muita gente já estava acordada e à volta dela. Eu ofereci minha barraca para ela dormir, ela recusou, dizendo que ia ligar para a mãe e ir embora assim que amanhecesse. Eu pedi desculpas e então me retirei para a minha barraca. Acordei cerca de uma hora depois, com a mãe dela, nervosa, ao telefone. Arrumei minhas coisas, a contragosto, e me preparei para subir a trilha com ela. Nessa hora tive chance de observar o pescoço dela. Haviam algumas marcas pequenas, de dedos, na parte detrás do pescoço. Tanto o _Infectus_ quanto o Parazitta, antes, tinham me falado das marcas terríveis que haviam visto no pescoço dela. Naquele momento, com a luz do dia já surgindo, não me pareceram tão terríveis assim.
Um barco veio buscá-la na praia, e um carro a estaria esperando na estrada para levá-la para casa depois. A mãe dela mandou-os. Fui com ela, conversei bastante, dei todo o meu apoio. Quando cheguei em casa, liguei para ela, deixando nome completo, telefone e endereço, se acaso fosse preciso uma testemunha. Só fui falar com o Skayller na segunda-feira. Ele queria devolver algumas coisas dela que estavam com ele, e pegar o computador dele, que estava emprestado para a mãe dela, mas queria evitar o confronto. Liguei para ela, me oferecendo para a troca, mas fui recebido por grosseria. Ela e a mãe diziam que só entragariam o computador se ele fosse pessoalmente, e deram um prazo de duas horas para que ele fosse até lá, caso contrário, o computador voltaria em pedaços.
Fomos até lá, eu, ele e o padrasto dele. Ouvimos demais. A Dadi, sentada em um sofá, fumava um cigarro enquanto a mãe dela gritava e esperneava. Dizia que a vida do Skayller valia menos que um tênis Nike, que era o que lhe custaria para mandar alguém do morro da mariquinha apagá-lo. Repetia várias vezes "tu sabe daonde eu vim" e fazia ameaças do tipo "um dia tu podes acordar com a boca cheia de formiga". Chamava-o de maloqueiro, vagabundo, psicopata e sem-pai. Em certo momento, chegou a ameaçá-lo com o cabo de uma enxada. Skayller, graças a muitas indicações minhas e do Chaves, o padrasto dele, ficou quieto. Era melhor assim, dissemos. Ele deveria escutar, aguentar as consequências dos seus atos, e não se manifestar, para não piorar as coisas. Deise, a mãe da Dadi, disse que mandara imprimir cinco mil folhetos com o nome do Skayller, endereço, telefone, nome dos pais, e "o que esse filho da puta fez", para distribuir pela UFSC. "Eu ia te matar! Mas pensei melhor, porque eu tô em recuperação, e resolvi fazer pior. Vou te deixar vivo, mas sem poder trabalhar, estudar, ou namorar. Florianópolis ficou pequena demais para você e a minha filha! Tu nunca mais vais conseguir um emprego nessa cidade, pelo menos não de jornal. Porque toda vez que sair emprego em jornal, eu vou catar o telefone, e dizer quem tu é!".
Então chutou o computador para perto dele, dizendo "pega essa merda e cai fora". Ele pediu pela fonte dele. Ela disse que a fonte ficava como pagamento pelo barco e o carro que ela precisou mandar para buscar a filha dela.
Saímos de lá e ele parou na primeira delegacia. Deu queixa da ameaça de morte, e do furto da fonte e de dois cheques assinados. Dois cheques de quatrocentos reais que ele havia emprestado para a Deise, e que obviamente, essa dívida não seria paga.
Segundo a Dadi, ela não fez a denúncia pois o IML estava fechado. Assim, faria a denúncia na segunda, para já poder fazer o exame de corpo delito. Até o momento que saímos de lá (15:00hs), ela não o havia feito. As marcas do pescoço, inclusive, haviam sumido.
Falou-se de um soco que ele teria lhe dado durante a briga. Eu não vi. eu não ouvi. Eu não vi marcas. Em certo momento ela disse "ele me acertou. Aqui." e apontou para a testa. Não havia nada.
Ontem, em um bar com alguns amigos, a fofoca que rolou foi essa: Skayller e sua tentativa de assassinato. Ouvir as diferentes versões da história que surgiram chegou a ser engraçado. A maioria delas era absurda. O Skayller cometeu uma agressão? Sim. E deve responder por seus atos, da maneira como prevê a lei. Ele cometeu uma tentativa de assassinato? Não. E definitivamente não há como provar que ela existiu. Mas difamação é algo tão grave quanto. Se uma pessoa erra, e erra feio, um belo susto é merecido. Dependendo da gravidade, é preciso que fiquem marcas, para que tal coisa não se repita. Mas punam e marquem uma pessoa pelos erros cometidos por ela. A mentira é algo tão inaceitável, moralmente, quanto a violência. Não existem lados certos nem errados nessa história. Só existe a verdade. E ela aos poucos surge, para o bem de ambos os envolvidos.
- Felipe Meyer
- Publicitário, redator e pseudo-quadrinhista. Ser humano do gênero masculino mais perto dos 30 que dos 20. Gestor de conteúdo do Jornal de Debates. Formado em Comunicação Social pela Faculdade Estácio de Sá de Santa Catarina. Casado, pai de uma linda coleção de revistas em quadrinhos, exilado de Florianópolis e tentando fazer a vida em São Paulo, na Auszuglândia.
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