Momento André Diniz.
Esse post foi especialmente reservado para André Diniz, e as minhas impressões sobre o cara. Já tinha entrado algumas vezes no site da Nona Arte, lido as primeiras páginas de uma ou duas histórias, e deixei morrer por aí. Semana passada entrei novamente na página, sei lá por que motivo, talvez um repentino acesso de "vamos conhecer mais sobre os quadrinhos nacionais, amiguinhos!". Quem lê esta porcaria de blogue já a algum tempo ou me conhece suficientemente bem, sabe que eu sou um velho fanático por quadrinhos "made in Brazil". O novo álbum de Paralelas deixou a desejar, mas é Watson Portela, oras. As novas histórias do Quebra-Queixo são pra lá de ruins, mas como foi bom ver Marcelo Campos desenhando a Liga da Justiça...
Mas... whatever! Vamos falar de André Diniz. Fawcett, Fawcett, Fawcett. Tanto ouvi falar dessa história e dos cinco prêmios que ela faturou (sem falar que se trata de Flávio Colin, cara que eu venero desde que li a lenda do "Romãozinho" numa falecida revista de histórias de terror). Baixei a versão em pdf, mas antes resolvi ler o tal "Papo Informal", colunada assinada por Diniz no jornal gratuito "Informal". Terminei o texto com um único comentário possível: o cara é foda. Todas as minhas ambições de publicação independente de quadrinhos (que havia sido previamente interrompida na edição #7 do fanzine O.V.N.I. - de 97, creio eu -, que nunca chegou a ser terminada) voltavam à tona naquele momento. Todas as influências que Sonia Bibe Luyten havia colocada na minha cabeça (no ótimo "Mangá - O Poder dos Quadrinhos Japoneses") sobre publicações em papel de jornal, além dos exemplos de revistas a baixo custo da época da Vidente; juntavam-se agora num emaranhado de idéias que aos poucos tomavam forma na frase "SIM, eu posso publicar quadrinhos no Brasil". Um pouco de viagem, mas eu sou assim, momentaneamente impressionável. Semre fui, sempre o serei.
Então eu li Fawcett. A introdução, sobre o personagem - o real e o mítico -, é impecável. Te deixa fascinado por aquela figura aventureira (que a maioria dos leitores, como eu, é obrigada a admitir, envergonhada, que sequer havia ouvido falar antes), e te faz querer pular as páginas e ler logo a história. E talvez seja este o maior pecado da revista.
Perceba, ou percebam, variando o número possível de leitores anônimos deste blogue. A revista é boa. A história é boa. Os desenhos de Colin são bons. Mas eu esperava muito mais de Colin, cujos desenhos sempre me deixaram extasiados (como a cena em que a mãe de Romãozinho, ferida, lança-lhe uma praga que tornalo-á imortal), e de Diniz, sobre quem os comentários que li e ouvi até então indicavam uma obra sem igual. Mas o trabalho total é apenas bom. Não se trata de um grande exemplo a ser seguido pelo quadrinhista brasileiro, ou um trabalho que carrega a "identidade" da HQ nacional. IMHO (e aqui fica salientado o M, pois a opinião é só minha, e não deve ser encarada como se eu apresentasse uma verdade absoluta, não, não e não), o "recheio" está grande demais. É uma história ágil e sem grandes pretensões, mas que poderia ter sido contada em menos páginas. Dá-se (ou melhor, deu-ME) a velha noção de "bolocks", "enjambré", ou, como é mais conhecida, "enchessão de linguiça". Triste a exaltação inicial na figura aventureira do Coronel H. P. Fawcett culminar numa história que aborda tão minimamente a sua pessoa, de forma tão "rasa", na falta de palavra melhor. Faltam detalhes, falta conteúdo. Resume-se ao "aventureiro inglês se perde na floresta amazônica". Bom... Pra não enrolar tanto, aqui fica minha opinião.
Li outras histórias dele, todas disponíveis no site. Nenhuma me agradou. Tenho de ser sincero. Quanto mais eu lia, mais me vinha à mente a idéia de parar de ler qualquer coisa que possuísse seu nome citado entre os autores.
Mas então nossa história dá mais uma virada súbita, caríssimo leitor, e este que vos fala resolve ler "Subversivos: Companheiro Germano". História boa, muito boa mesmo. Remexi na pasta onde eu havia salvo as revistas em pdf da Nona Arte, e encontrei as outras duas histórias desta série ("Subversivos" e "Subversivos: A Farsa"). Ótima retratação de uma época, de tamanha importância para o quadrinho nacional, que eu me permitiria inclusive a compará-la a "Gen: Pés Descalços" (que fala sobre a bomba de Hiroshima, assim como "Subversivos" aborda a tragédia desumana mais próxima que temos em nossa história: a ditadura). E não estaria longe da verdade, considerando que as duas primeiras histórias de "Subversivos" foram compiladas em uma nova revista, devidamente modificada e reeditada para o seu uso nas escolas, como aconteceu, em circunstâncias parecidas, com "Gen..." (uma das poucas obras japonesas sobre o assunto, e provavelmente a única a chegar ao ocidente).
Não parando por aí, li "31 de fevereiro", não somente escrita como também desenhada por Diniz (assim como na primeira "Subversivos". O trabalho dele como desenhista não é do meu agrado, mas ainda assim, merece o devido respeito). Imaginem um Brasil onde Carmen Miranda é a nova dançarina do Tchan, FHC é um líder revolucionário comunista, o Plano Real é instituído por Getúlio Vargas, Pelé e Ronaldinho conquistam o "tri", e pode-se saber das últimas notícias entrando no site da revista "O Cruzeiro". Nesse cenário, Gilda, um travesti que passou oito anos na prisão por um crime que não cometeu, é contratado pelo cafetão Claudionor para assassinar Carlos Lacerda, a pedra no sapato de Getúlio. Foi a história que, por fim, fez-me brilhar os olhos e ver o grande talento que esse cara tem. Não mais o talento exagerado sugerido por aqueles que idolatraram Fawcett, nem o talento porco do qual eu fui grande crítico narciso (do tipo que faz críticas aos outros em frente ao espelho). Também não acho mais que o cara seja "foda".
Mas ele é bom. Talvez, assim, baixinho, sem ninguém me ouvir, eu admita que ele é bom pra caralho. Mas a opinião oficial deste que vos fala é a de que ele é só bom. Talvez eu até me atreva a ler Fawcett uma segunda vez, já sem me deixar levar tanto pela grande expectativa criada pela babação de ovo em cima dos tais cinco prêmios.
- Felipe Meyer
- Publicitário, redator e pseudo-quadrinhista. Ser humano do gênero masculino mais perto dos 30 que dos 20. Gestor de conteúdo do Jornal de Debates. Formado em Comunicação Social pela Faculdade Estácio de Sá de Santa Catarina. Casado, pai de uma linda coleção de revistas em quadrinhos, exilado de Florianópolis e tentando fazer a vida em São Paulo, na Auszuglândia.
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